11 agosto 2009

UM DOS MAIORES INFECTOLOGISTAS DO PAÍS CRITICA FORMA COMO MINISTÉRIO DA SAUDE COMBATE A NOVA GRIPE


Edimilson Migowiski - À espera do caos

O infectologista Edimilson Migowiski, presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações, no Rio de Janeiro, chefe do serviço de infectologia pediátrica e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), é um dos médicos mais requisitados do País quando o assunto é a gripe suína, a A (H1N1), que há 4 meses apavora o planeta, com o registro de mais de 800 mortes. No Brasil, já são mais de 60 óbitos. Migoswiski critica com veemência a postura do Ministério da Saúde na tentativa de controlar a doença que, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), já se propaga com “velocidade sem precedentes”.

1 – Os números de casos da nova gripe no País já apontam para uma pandemia. O sistema de saúde público brasileira está preparado para
esta situação?
Estamos realmente vivendo uma pandemia e, na minha opinião, o Brasil não estava preparado para isso.

2 – O que acha da distribuição do medicamento feito pelo Ministério
da Saúde?
Considero a medida centralizadora por não facultar às pessoas o direito de comprar o medicamento, já que exerce um controle rigoroso, não permitindo a venda pelas farmácias. O Ministério priorizou atender o grupo de risco – os imunodeprimidos, portadores de doenças crônicas (diabete, pneumopatia, hepatopatia, nefropatia, neuropatia e cardiopatia grave) e respiratórias (asma e bronquite), obesos, idosos e crianças menores de 2 anos. Algumas vezes, o Ministério diz que esta gripe é como uma doença qualquer, em outras, age de forma a não justificar isso, como quando compra 150 respiradores de maneira emergencial, controla a distribuição do medicamento, cerca um avião em Brasília de carros da Anvisa (Agência nacional de Vigilância Sanitária), por ter, entre os passageiros, uma pessoa infectada e adia o retorno às aulas.

3 – A evolução da doença em pessoas que não fazem parte do grupo risco é rara?
Não fazer parte do grupo de risco não impede que o quadro evolua mal e o paciente chegue ao óbito, como em casos já ocorridos. O tratamento deve ser iniciado nas primeiras 24 a 48 horas. Quanto mais tempo sem medicamento, maior o risco de o vírus se replicar e aumentar o número de células agredidas.

4 – Não há vacina disponível para esta gripe. O Brasil teria condição
de desenvolvê-la?
Alguns órgãos do Governo dizem que fazem vacinas, mas acredito que vendem sonhos e entregam pesadelos. Temos
pesquisadores brilhantes e o Brasil não faz mais descobertas não por falta de talento, mas de investimentos.

5 – O médico corre o risco de ser acusado de não ter feito o diagnóstico correto da gripe?
O médico faz o atendimento, mas quem decide se o paciente receberá o medicamento é o Ministério. O tratamento tem sido como no tempo da pedra: seja o que Deus quiser. Sabemos que tem que haver a fé, mas precisamos ajudar.

6 – A gripe suína tem um grau de letalidade maior que o da gripe comum? E até que a da espanhola e da gripe aviária?
A gripe aviária tem 60% de letalidade; a espanhola, 4%; a A H1N1 (suína) varia de região para região. No início, estava em 6,2%, mas depois reduziu para a faixa de 0,1% a 2%. No momento, no Brasil, pode ser
considerada baixa.

7 – A quarentena (isolamento) é importante? E era necessário adiar a volta às aulas?
Oriento que pessoas imunodeprimidas, ou que não façam uso do medicamento, guardem uma quarentena até que o vírus seja destruído pelo organismo. Mesmo que surja um vírus mais resistente, não vai ficar para a vida toda, assim como pode ser o vírus HIV. Sobre o adiamento das aulas, qualquer medida para evitar aglomeração de pessoas é importante. O vírus influenza A (H1N1) é como uma tempestade e tem um tempo para passar. Ele dura pelo menos 6 semanas. Isto baseando-se em outras pandemias e epidemias de influenza.

8 – O vírus pode sofrer mutações? E qual o medicamento utilizado?
Sim, esse é o receio de todos os estudiosos. O remédio é Oseltamivir ou Zanamivir. São os antivirais mais utilizados no mundo para o tratamento da gripe.

9 – O senhor é um crítico contundente do Ministério da Saúde?
Não vejo como o Ministério da Saúde e sim como o ministério da doença. Quando falamos em saúde pública, não é saúde, é doença pública. A saúde é de poucos. Isso, principalmente, por causa dos poucos investimentos em prevenção, como doenças que podem ser evitadas com vacinas, a exemplo da hepatite A, meningite por meningococo, HPV (vírus do câncer do colo do útero), que acomete cerca de 20 mil mulheres no País por ano. Estas vacinas não estão disponíveis na rede pública. Temos como exemplo a vacina do rotavírus, que passou a fazer parte do calendário da saúde pública e mudou expressivamente o quadro da doença no Brasil. Há cerca de 3 anos morriam de 2 mil a 3 mil crianças por ano vítimas da doença. Atualmente, foram reduzido em 70% os casos
de internação.

10 – O que acha das tendas de atendimento como providência emergencial?
As tendas são bem organizadas e bem estruturadas, porém, foram tardias e fizeram os hospitais públicos e privados ficarem sobrecarregados. Mesmo nesta medida emergencial, as pessoas são atendidas, saem com o diagnóstico, mas sem o medicamento, falta o tratamento.

Um comentário:

  1. Oi Wânia! Haveria algum modo de entrar em contato com o Dr. Migowiski? Eu traduzi um documento do Centro Europeu de Controle e Prevenção de Doenças (ECDC) em conjunto com a OMS/Setor Europeu. Trata-se de um Protocolo, elaborado em Estocolmo em Junho/2009, de como a comunidade européia deve agir em relação à pandemia. Com relação à tão propalada "irresponsabilidade" que seria, de acordo com o governo, ampliar o fornecimento dos antivirais, veja o que estabelece esse documento: “Muito ocasionalmente, vírus de gripe que tenham resistência primária a uma ou outro droga antiviral podem surgir naturalmente, como resultado de mutação genética e recombinações virais, que são costumeiras. Isto aconteceu durante a estação 2007-8 na Europa, quando um vírus de gripe apareceu, que era resistente ao oseltamivir. O fato NÃO se relacionava ao uso do antiviral E ESSA POSSIBILIDADE NÃO DEVE INFLUENCIAR OS PROTOCOLOS DE USO DOS ANTIVIRAIS DURANTE PANDEMIAS”. Ora, este protocolo foi escrito EM CONJUNTO com a OMS/européia. Então como é que o Temporão diz que ESTÁ SEGUINDO O QUE A OMS RECOMENDA? Ou a OMS recomenda uma coisa aqui e outra ali, de acordo com a cara do freguês? Wânia, você sabe um jeito de eu poder mandar esse protocolo em sua íntegra ao Dr. Migowski? (a tradução completa encontra-se num blog que acabei de criar para comentar sobre a gripe: http://www.nianga.blogspot.com Obrigada!

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