Não é bem assim. "Sempre há ansiedade porque a novela é um produto de cultura popular, que só se realiza através da audiência", diz o escritor, que volta ao horário nobre com uma nova Helena - a primeira negra, que será vivida por Taís Araújo.
Mas Maneco, como é carinhosamente chamado no meio televisivo, não faz caso da questão racial. Para ele, o que de fato importa na trama é mostrar - a brancos e negros - que problemas devem ser superados.
Desta vez, a história vai se afastar um pouco do Leblon, bairro da zona sul carioca que virou símbolo das novelas de Manoel Carlos. Parte da trama vai se passar em Búzios - outra paixão do escritor. Temas comuns de suas criações, como a traição, estarão presentes. Mas ele é taxativo ao comentar o assunto. "O tema recorrente nas minhas novelas é a lealdade, o que é bastante diferente", diz. Confira abaixo a entrevista com o escritor.
Em Viver a Vida, há uma modelo que ficará tetraplégica (Alinne Moraes) e uma vítima de anorexia alcoólica (Bárbara Paz). São personagens com obstáculos a serem superados. A novela trata da dificuldade de se viver a vida?
O grande tema da novela é o de que a vida vale a pena e que é preciso acreditar nisso para transpor os obstáculos que existem e sabotam a nossa felicidade. É isso. Não existem becos sem saída, à exceção da morte. Mas não se trata de uma liçãozinha de esperança, muito menos de uma infantilização "à la Pollyana", que via apenas o lado positivo da vida. Não. É apenas um convite para se viver a vida intensamente, enfrentando os revezes, as doenças e mortes, mas mantendo a disposição para viver. Quer dizer: a vida vale a pena.
A anorexia alcoólica faz parte do merchandising social da novela? Como fazer marketing social sem ser didático?
Eu até hoje não entendo bem isso que se convencionou chamar de merchandising social, como se fosse um evento. A doença e a morte, assim como a saúde e a vida, são fatos concretos que rodeiam toda a espécie humana. Portanto, é impossível contar uma história sem que essas coisas estejam presentes. Se eu for didático de maneira inevitável, paciência. Não tenho receita para evitar isso. E muitas vezes nem mesmo quero evitar. Ser didático, em algumas circunstâncias, é a melhor - se não a única - maneira de ser ouvido. E mais: de ser compreendido.
Viver a Vida terá locações em Búzios. Você decidiu deixar o Leblon?
O Leblon estará na novela, como sempre, mas dando um pouco de espaço a Búzios, um balneário belíssimo que há muitos anos me encanta e atrai. A ideia de dividir a ação entre Rio e Búzios já existia em Páginas da Vida, mas só agora estou realizando.
Taís Araújo é a sua primeira Helena negra. Por que só agora uma Helena negra?
Uma atriz negra para o papel de protagonista não foi uma preocupação, um objetivo, uma deliberação. Não parti desse ponto para dar o papel a Taís. Pensei em fazer a história de uma mulher ao redor dos 30 anos, que fosse bem-sucedida numa profissão de projeção internacional. Pensei em fazer a história de uma atriz, mas essa é uma profissão que tem a barreira da língua para uma projeção internacional. Pensei numa cantora, mas nessa área o sucesso no exterior não é tão fácil de ser medido. Também me ocorreu criar uma Helena que tivesse uma carreira brilhante na música erudita, mas achei que isso elitizaria demais a personagem. Então, por exclusão, cheguei à de modelo, já que essa é a profissão que permite alcançar sucesso em idade bastante nova, assim como desfrutar de boa situação econômica.
Os personagens de José Mayer, Taís Araújo e Thiago Lacerda formarão um triângulo amoroso?
Ainda não posso afirmar categoricamente, mas é possível que isso aconteça [logo no começo da trama, Helena (Taís Araújo) se casa com o recém-divorciado empresário Marcos (José Mayer) e conhece o fotógrafo aventureiro Bruno (Thiago Lacerda)].
Por que a infidelidade é um tema recorrente em suas novelas?
O tema recorrente nas minhas novelas é a lealdade, o que é bastante diferente. Pode-se ser infiel sem ser desleal. Esse tema me atrai, já que para mim a lealdade é a rainha-mãe de todas as virtudes humanas. Me lembro da cena de Hamlet [peça de William Shakespeare], em que Polonius se despede do filho Laertes, que vai viajar. Depois de desfiar uma série de conselhos, ele fecha, dizendo: "Mas, principalmente, sê leal contigo mesmo".
A novela começa em 2008 e lá pelo capítulo 25, passa para 2009. Quando entrarmos em 2010, a novela entrará, também. O que vai deixar claras essas passagens são notícias de atualidade, inclusive as econômicas, que foram essas que marcaram e estão marcando este ano, como a crise em todo o mundo, assim como a eleição do [Barack] Obama. Sempre que possível e relevante, as notícias poderão ser dadas ao vivo ou gravadas 10 ou 15 minutos antes. Mas como esse é um problema operacional, relativo à área técnica, eu não tenho condições de afirmar com segurança.
Os seus textos não têm antagonistas malévolos como os de outros autores. Haverá um grande vilão nesta trama?
Minhas novelas têm personagens que cometem vilanias, que vivem momentos de ódio, como todos nós. A mídia se habituou a ver vilões assassinos. Não faço isso. Nunca fiz. Em Viver a Vida, as personagens Dora (Giovanna Antonelli) e a filha dela, de 8 ou 9 anos, Rafaela (Klara Castanho), são levadas a praticar maldades para se defender de injustiças cometidas contra elas. É por aí que eu gosto de ir.
Que atriz o senhor gostaria que vivesse uma de suas próximas Helenas?
No caso das Helenas, eu parto da personagem para encontrar a atriz. Não me adiantaria querer que a Helena fosse, por exemplo, a Lília Cabral, se a personagem que eu tivesse em mente, na ocasião, não fosse adequada a ela. Eu não digo: vou fazer uma Helena com a atriz tal. Eu digo: que atriz eu tenho para essa Helena que eu quero fazer?
Que atores não podem faltar em uma novela sua?
Eu tenho os meus preferidos, que são atores e atrizes que me cativaram durante esses anos todos, incorporando meus personagens com grande proveito. São muitos, mas assim, de pronto, eu cito Regina Duarte, Lília Cabral, José Mayer, Tony Ramos, Suzana Vieira, Natália do Vale e Lica Oliveira.
Que rotina o senhor segue enquanto escreve a novela? Com quantos colaboradores trabalha?
Não tenho efetivamente uma rotina. Não apenas quando escrevo novela, mas de um modo geral. Não gosto de hora certa para dormir, acordar e fazer refeições. Não uso relógio há 50 anos. Quanto às minhas colaboradoras (são todas mulheres), disponho de seis, entre elas minha filha Maria Carolina, que me assessora desde 1991, quando fiz Felicidade. Além dessas seis, disponho também de três pesquisadoras exclusivas. Todas trabalham full time.
A audiência das novelas já não é a mesma de dez anos atrás. Como esse fato influencia a escrita de Viver a Vida?
Posso lhe garantir que em absolutamente nada. Faço, mais uma vez, o texto que eu sei e gosto de fazer. É a minha 11ª novela na TV Globo. Elas têm, em comum, os mesmos possíveis defeitos e as mesmas possíveis qualidades. Todas tiveram muito boa audiência, sem exceção. Espero contar com a generosidade do público também em Viver a Vida.
O senhor já tem algum projeto para depois da novela?
Sim, penso num romance, que seria sobre o cotidiano de uma família aparentemente feliz. Penso em publicar alguns contos, também sobre fatos corriqueiros.
Mas acredito ser mais um cronista do que um escritor de romances e contos [Maneco é colunista de VEJA Rio].
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