25 maio 2010

ENTREVISTA COM CARLOS ALBERTO TORRES - O CAPITÃO NÃO ACREDITA

Guilherme Bryan
guilherme.bryan@folhauniversal.com.br

Em 21 de junho de 1970, o Brasil ganhava a Copa do Mundo do México e tornava-se tricampeão, com o capitão Carlos Alberto Torres erguendo a taça Jules Rimet.
Após 40 anos, ele relembra a conquista e a trajetória de melhor lateral-direito do século 20, título que recebeu na Copa do Mundo de 1998, na França.
Fala das passagens como jogador pelo Santos, Fluminense e New York Cosmos, da carreira como treinador e avalia o futebol atual e a seleção do técnico Dunga.

1 – Quais são as lembranças da conquista do tricampeonato no México?
As maiores lembranças são o gol que fiz na final (o quarto dos 4 a 1 contra a Itália) e a alegria da volta olímpica e do recebimento da taça Jules Rimet.
Porém, o jogo mais difícil foi Brasil e Inglaterra, por eles terem um grande time e virem da conquista do campeonato mundial anterior.
Além disso, o perdedor jogaria na altitude contra uma equipe já adaptada (a Inglaterra perdeu para a Alemanha por 3 a 2 nas quartas de final).

2 – No que aquele futebol se diferencia do praticado hoje?
Na nossa maneira de jogar prevalecia o drible e a criatividade.
Esse sempre foi o forte do futebol brasileiro e o que o torcedor do mundo inteiro gosta de ver, mas falta um pouco hoje em dia.
Por isso, quando aparece um Robinho ou um Wellington Silva dando pedaladas, todo mundo acha sensacional. É esse futebol bonito que o Messi (jogador argentino, eleito o melhor do mundo pela FIFA em 2009) joga.

3 – Você acredita que o governo militar tenha se aproveitado da conquista do tri?
Foi uma época de ditadura, que coincidiu com a conquista, e o Governo pode até ter tentado tirar proveito da situação, mas não tenho lembrança de ele ter utilizado os jogadores para isso. Ganhamos apenas alguns premiozinhos vagabundos, como um carrinho dado pelo Paulo Maluf (então prefeito de São Paulo) e lembrancinhas de algumas lojas. Nada comparável ao que se ganha atualmente.

4 – Você concorda com o título de melhor lateral-direito
da história?
Eu agradeço, mas tivemos na posição grandes jogadores como Djalma Santos, Leandro, Jorginho e Nelinho. Eu fui um dos primeiros laterais a jogar na frente, pois, antes, ele ficava mais na marcação para conter os ponteiros ofensivos, dribladores e rápidos.
Hoje não há mais ponteiro ofensivo e o lateral virou ala e pode partir com liberdade para frente e fazer as jogadas. Maicon e Daniel Alves, que estão na seleção, são dois grandes jogadores.
O Maicon tem mais força física e grande técnica, e o Daniel possui mais agilidade ofensiva. É um problema para o Dunga resolver.

5 – Há chance de o Brasil ganhar a Copa do Mundo na África do Sul?
Chance sempre há, mas todas as seleções que ganharam a Copa tinham pelo menos dois jogadores que fizeram a diferença. Em 1970, Pelé e Jairzinho; em 1994, Romário e Bebeto; e, em 2002, Ronaldo e Rivaldo.
Todos os jogadores do Dunga são bons, mas nada de extraordinários, exceto Kaká, que é uma incógnita e não está nem jogando no Real Madrid, e o goleiro Julio Cesar. É muito pouco.

6 – Há uma tendência de os jogadores trocarem cada vez mais rápido os times brasileiros pelos do exterior?
Não há como evitar, a não ser na hora em que os clubes brasileiros se organizarem melhor, principalmente no aspecto financeiro, e tiverem condições de fazer um contrato longo com os jogadores, pagando quase o equivalente do que eles ganhariam na Europa, como aconteceu na primeira fase do Robinho no Santos. Agora a maioria dos clubes brasileiros não tem dinheiro para segurar os jogadores e não
ganhará nada bancando a formação de novos.

7 – O Santos atual pode alcançar conquistas semelhantes as do time da década de 60, no qual você jogou?
No Santos daquela época, do goleiro ao ponta-esquerda, todos os jogadores tinham nível de seleção brasileira, o que não acontece com o Santos atual. Há três ou quatro jogadores excepcionais, mas não são os onze que têm condições de representar a seleção. Aquele time do Santos era superior, principalmente porque tínhamos o Pelé. Qualquer time que tivesse o Pelé seria superior aos demais.

8 – Como foi a experiência de jogar no Cosmos, de Nova York, e treinar as seleções da Nigéria e do Azerbaijão?
O Cosmos talvez tenha sido precursor do futebol atual. Quando eu e Pelé fomos para esse time tivemos 6 anos extraordinários e muitos jogadores na época queriam jogar lá, assim como hoje querem ir para a Europa. Agora treinar seleções estrangeiras é legal, porque lá é assinado contrato de 3 anos e, em 99% dos casos, os caras te seguram até o final e confiam em você, diferente do que acontece aqui.

9 – Por que você jogou no Cosmos como líbero?
Em 1971 eu jogava no Botafogo e, na final do Campeonato Carioca, tive uma lesão séria no joelho e operei. A contusão que eu tive equivalia ao fim de carreira. Mas fiz um esforço muito grande e, em 6 meses, voltei a jogar por mais 11 anos, mas com dificuldades para jogar na lateral. No Santos passei a ser zagueiro central ou quarto zagueiro e deu certo. Fui para o Cosmos como líbero. Até hoje muita gente me coloca como quarto zagueiro na seleção do Brasil de todos tempos.

10 – Os ex-jogadores são aproveitados como merecem pela Confederação Brasileira de Futebol (CBF)?
Fui capitão de uma seleção campeã do mundo, considerada a melhor de todos os tempos. Não tenho nada que atente contra minha integridade e moral, e sou apontado como melhor jogador na posição. Como vereador fui primeiro-secretário da Câmara Municipal do Rio de Janeiro. Mesmo assim, não sou aproveitado para nada. Se tivesse nascido na Europa, certamente seria até presidente de clube.

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