10 fevereiro 2010

Vaidade, o pecado preferido da humanidade


No filme “O Advogado do Diabo” o ator Keanu Reeves interpreta um advogado com mais de 60 vitórias em juízo, que para mostrar a todos que é o bom, aceita defender causas perdidas e réus culpados.
Em certa ocasião ele defende um professor de matemática acusado de pedofilia, e mesmo sabendo que o maldito era culpado, usa todo seu esforço para inocentá-lo.

Kevin, o personagem de Keanu Reeves é um cara extremamente vaidoso.
A ele não importam valores, nem mesmo o certo e o errado; importa-lhe impor-se como o grande advogado criminal, ganhar muito dinheiro e defender com unhas e dentes cada pleito, mesmo tratando-se de uma causa apócrifa.

Ao assistir o filme, não pude fugir de algumas questões: Não seria Kevin, o advogado vaidoso, um arquétipo da humanidade, representante fiel da nossa egolatria, do culto à personalidade, do nosso endeusamento cotidiano?
Quantos Kevins existem por aí, no casamento, por exemplo?
Incapazes de reconhecer que a esposa tem razão, acabam por fazer as maiores burrices do mundo, tudo em nome do grande ego!
É comum ouvir de alguns esposos: “Se eu tivesse ouvido minha mulher, não estaria nessa situação”.
Mas o que os impede de ouvi-las? O orgulho!
Um orgulho machista do tamanho de um bonde, e uma vaidade que não cabe no ser humano. Tudo tão simples, e tão complicado!

Nem mesmo o cristão está imune a este mal.
Aliás, muito comumente eles são as maiores vítimas de tais sentimentos.
É comum, por exemplo, ver o nobre desejo de servir, se converter – com o passo dos anos –em uma neurose eclesiástica onde o indivíduo sente-se na obrigação de produzir sempre e em maior escala, para sentir-se em paz consigo mesmo.
Nesse ponto, o serviço cristão deixa de ser uma benção e se transforma em alimento para o ego inchado do crente. O mesmo acontece com pregadores, cantores e ouvintes; do dia pra noite percebe-se que aquele belo sermão não foi motivado pelo desejo de servir à grei, mas pela vaidade do pregador amante dos holofotes.

Para este veneno chamado egolatria existe apenas um antídoto, a mortificação.
Somente quem entende que “cada boa dádiva e dom perfeito descende do alto”, pode livra-se da terrível tentação de sentir-se mais importante do que, de fato, é.
É preciso ver nossas virtudes como mortas, e nossas obras naturais como realmente estão. Cabe também a cada cristão dar morte aos seus desejos e vontades, afim de fazer prevalecer somente a vontade do Senhor.
Só assim lograremos escapar deste terrível pecado [a vaidade] o qual, segundo a tradição cristã, transformou os anjos em demônios.

Esse texto de Leonardo Gonçalves para o Pulpito Cristão,veio em um momento em que tenho observado a vaidade exagerada das pessoas.
Tentam ser o que nunca serão ou pensam ser o que não existe.
Vivem em uma sociedade e se imaginam em um pedestal que é fruto de uma imaginação vazia.

E quando caem desse "altar", o tombo é imenso, com ferimentos incuráveis e muitas vezes, causa morte, pois o fantasma que os derrubou, é sua própria imaginação e por isso, não encontram ninguém para socorrê-los.
É muito perigoso!!!

Guardo um texto incrível de Mário Ypiranga Monteiro Neto(Promotor de Justiça e Membro da Academia de Letras, Ciências e Artes do Amazonas), que lí há algum tempo e que relata claramente a que ponto chega a estupidez da mente conturbada...vaidade.



A VAIDADE

Vaidade, na definição de Aurélio, é a qualidade do que é vão, vazio, firmado sobre aparência ilusória.
A vaidade, sentimento que esvazia e dispersa.
Interessante é o modo como procede, criadora do absurdo e do irreal aos olhos alheios.

A vaidade é a irmã da mentira.
É, sobretudo, o desprezo da verdade, pois seu portador traz idéias e conceitos equivocados, desagradáveis.
O sentimento conduz-nos ao labirinto tétrico da superioridade que o coração traiçoeiramente nos oferece, mas a alma não aceita.

A mais desprezível das vaidades decorre da sabedoria, a vaidade intelectual que faz os homens superiores aos demais, e superiores no saber, que os “eleva” bem ao alto de suas (in)capacidades e, quando tombam ao som ensurdecedor, pousam no espurco chique de onde se originaram.

Há a vaidade que surge da beleza, do dinheiro, da classe social; há, também, a vaidade que surge da idade, a sensação ignóbil de algum empantufado, que, por ter passado uns vinte ou trinta anos na repartição, se crê dotado de amplo poder de correção e conhecedor de todos os segredos da história da sociedade e do poder e faz de seu gabinete casamata de sua incompetência.

Na verdade, ocorre que, quem não obteve o sucesso e se encontra encardido pelo tempo, sente repulsa do brilhantismo jovem, que flui naturalmente.


A vaidade que deriva do poder é risível.
Certas pessoas não conseguem largar o poder e a arte da falsidade, da dissimulação e da mentira e entrelaçam-se com êxito na ambiência política, e a falta de escrúpulos tem satisfatório desempenho na política de quem emprega tais meios.
Como diria Francis Bacon, os vaidosos são os joguetes desprezados dos homens sábios e discretos, o objeto de admiração dos tolos, os ídolos dos parasitas e os escravos de sua própria vaidade.
A vaidade nada cria e, quanto mais se tem, tem-se a menos.

Com a exposição indevida, comunicam-se os defeitos que o recato encobria e, se não há talento, o sentimento enfraquece a original essência.
A literatura diz-nos que existiam tipos de mármores perfeitos, que não precisavam de uma camada de cera, aplicada aos defeituosos.
Aqueles eram o que eram. Estes, ao contrário, eram eles e mais uma substância que os fazia parecer o que não eram.
Falaz polimento, superficial sentimento!

Deixo ao leitor a reflexão.
O mundo anda mesmo pouco atraente.
A pungente e cruel realidade da vaidade e da mediocridade... Tudo parece muito igual, com exceção dos que se põem a salvo pela poesia diária... Peço licença, então, para dizer-lhes: a moda, agora, é dos sem-vaidade.

Mário Ypiranga Monteiro Neto é Promotor de Justiça e Membro da Academia de Letras, Ciências e Artes do Amazonas

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