02 novembro 2009

Glória Kalil se pronuncia sobre o vestido da universitária


Em setembro de 1968 Caetano Veloso e os Mutantes foram intensamente vaiados por jovens, a maioria deles universitários, no festival de música da TV Record, o mais importante acontecimento musical da época. O motivo? Usar roupas atrevidas e cantar uma música pouco convencional, cujo título - ironia das ironias - era: É proibido proibir.

“A música de Caetano foi recebida com furiosa vaia pelo público que lotava o auditório... Os Mutantes mal começaram a tocar a introdução da música e a plateia já atirava ovos, tomates e pedaços de madeira contra o palco. O provocativo Caetano apareceu vestido com roupas de plástico brilhante e colares exóticos. Entrou em cena rebolando, fazendo uma dança erótica que simulava os movimentos de uma relação sexual. Escandalizada, a plateia deu as costas para o palco. A resposta dos Mutantes foi imediata: sem parar de tocar, viraram as costas para o público”. Trecho tirado do site Tropicália.

Quarenta anos depois, em 30 de outubro de 2009, uma jovem é vaiada, desacatada, agredida e quase linchada por seus colegas de universidade (a Uniban, Universidade Bandeirante, em São Bernardo do Campo - SP), por estar usando um vestido curto demais. Foi isolada numa sala de aula, rodeada de centenas de rapazes e moças furiosos que a xingavam e ameaçavam de surra e estupro. A moça, coberta por um guarda-pó branco, saiu escoltada pela polícia.

É aterrador. Mais ainda por serem jovens supostamente educados e privilegiados, já que podem frequentar e pagar uma universidade particular. Que gente machista, convencional, violenta, é esta?

Impressionante como a maneira de vestir provoca reações extremadas nas pessoas. Por isso, vivo alertando sobre os riscos de não saber fazer a leitura correta do significado das roupas e sair por aí mandando sinais errados que vão ser mal interpretados. A jovem foi ingênua de achar que poderia ignorar os códigos da moda, que se baseiam em adequações: roupa certa para o lugar certo.

Ela usou roupa de balada na hora errada e foi massacrada por isso. Uma punição completamente desproporcional ao deslize. Ela esqueceu também que indivíduos, covarde e sabidamente, se comportam diferentemente quando estão em bandos, formando multidões. Em lágrimas, a moça relatou: “fui xingada até por meninas que moram perto da minha casa e que tomam ônibus comigo. Me trataram como se eu fosse um bicho”.

Chamem os universitários e coloquem esses delinquentes na cadeia.

Um comentário:

  1. é a ética do linchamento

    funciona assim:
    se você está sozinho, pode até odiar aquele estuprador, mas jamais teria coragem de desferir um simples golpe em seu rosto.

    não se trata de medo, mas da relação do ato com sua culpa.

    dentre aquelas pessoas que nós vemos nas imagens gravadas pelas redes de televisão, reunidadas de frente às delegacias, clamando pelo sangue do criminoso, é claro que há bandidos perigosos, e geralmente são eles que atiram a primeira pedra.

    mas a maioria daquelas pessoas são "gente de bem", avessas à violência, mas que acreditam (não sei porque diabos) que uma vez que elas estão no grupo, perdem a identidade.

    a ação violenta deixaria de ser dela própria, mas do grupo. e consegue resolver bem o sentimento de culpa internamente, pois não teria sido ela a "rumar" a enchada na cabeça do indivíduo, mas o grupo.

    o que fizeram com a universitária foi isso. linchamento. ninguém se importa de ter participado daquilo, afinal não foi ele, mas o grupo.

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